segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Meu caminho

A cidade grande faz a gente pensar. O desenho da calçada ainda mais. Ou só pisa no branco ou só no preto. Na linha, nem pensar!

O legal de São Paulo são aquelas guias em altorrelevo para cegos no chão. Você vai andando, seguindo as curvas, arrisca fechar os olhos pra ver se  consegue andar sem olhar. É uma forma de distrair a mente dos problemas.

Vou andando, com a mente nas nuvens, em linha reta, na guia para cegos. O espaço é só para um. Se cegos estiverem com amigos, têm que andar em fila indiana.

Com sucesso, vou andando de olhos fechados. Abro-os só para garantir que estou no caminho certo (e de que não estou no meio da rua, prestes a ser atropelado). A 50 m vejo um pivete, na mesma guia que eu, mas no sentido oposto.

Não era justo. Que preocupações tinha aquela criança? Ela não precisa dessa terapia. Não precisava, mas estava lá, determinada. Cara marrenta, bico feito.

Mas espera. E eu? Não podia pisar fora, no preto nem no branco. Se ela estava determinada, eu também estava. Segui em frente, com o passo acelerado. O pivete largou do braço da mãe e também aumentou a velocidade.

E agora?

Perto dos dois metros, paramos ambos. Encaramo-nos.

Tentei mas não resisti, sai do caminho, que ela, orgulhosamente, seguiu em frente, sem sair da guia, nem pisar no preto nem branco. E eu, humilhado e derrotado, pisava em todas as cores e riscos possíveis.

Olhei adiante e tinha um grande caminho ainda. Não retomei ao jogo. Fui andando, pensando nos problemas. Não valia mais à pena.

2 comentários:

Lívia Inácio disse...

Quanta sensibilidade!

Nana Maia disse...

Você escreve muito bem. Parabéns.

Visite o meu tbm:

http://conta-uns-contos.blogspot.com